Carta 5

De: Alguém que precisa transbordar o ordinário e cotidiano
Para: Algum desocupado ocasionalmente interessado em ler.

***

Caro leitor,

    Sinto muito pelos frangalhos em que esta carta se encontra. Nesse mísero papel descontei a raiva que mora em meu peito nesse momento. Não queria ter que descontar mundo a fora nem sobre quem, de fato, mereceria sentir a ira de meus olhos. 
    Não. Não sou uma pessoa de devolver no mesmo lado da moeda. Mesmo que seja um ódio dilacerante, que instiga a úlcera em meu estômago, faz as lágrimas salgarem meu rosto à força... Eu não quero. Não quero fazer alguém passar pelo que me queima o cérebro.

    É uma raiva que vem da injustiça dos acontecimentos. A raiva de ter que ver o ego falando mais uma vez por cima de tudo. A raiva de ver que não há mais quem ceda nas situações.
    Mentira, há sim. 

    É a raiva do cansaço de ceder sempre. É a raiva de sentir o calo apertar sob o meu coturno e não sob os pés descalços de outrem. É a raiva de saber que atrás de tudo isso há muito amor e no fim desse mar revolto... o amor estará na areia, se recuperando das ondas, batendo as roupas e se levantando. 
    Agora, com o peito em fogo, sinto que poderia gritar. Abrir-me em dois. Cometer algum ato de violência. A raiva é uma força motriz breve, como uma chama de um fósforo.
    E, após incandescer, o cansaço. O fim. O corpo dolorido. O peito vazio.

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